ASSUSTADORAMENTE ACTUAL...
"Um povo imbecilizado e resignado, humilde e macambúzio, fatalista e sonâmbulo, burro de carga, besta de nora, aguentando pauladas, sacos de vergonhas, feixes de misérias, sem uma rebelião, um mostrar de dentes, a energia dum coice, pois que nem já com as orelhas é capaz de sacudir as moscas; um povo em catalepsia ambulante, não se lembrando nem donde vem, nem onde está, nem para onde vai; um povo, enfim, que eu adoro, porque sofre e é bom, e guarda ainda na noite da sua inconsciência como que um lampejo misterioso da alma nacional, reflexo de astro em silêncio escuro de lagoa morta.
[.] Uma burguesia, cívica e politicamente corrupta até à medula, não descriminando já o bem do mal, sem palavras, sem vergonha, sem carácter, havendo homens que, honrados na vida íntima, descambam na vida pública em pantomineiros e sevandijas, capazes de toda a veniaga e toda a infâmia, da mentira à falsificação, da violência ao roubo, donde provém que na política portuguesa sucedam, entre a indiferença geral, escândalos monstruosos, absolutamente inverosímeis no Limoeiro.
Um poder legislativo, esfregão de cozinha do executivo; este criado de quarto do moderador; e este, finalmente, tornado absoluto pelaabdicação unânime do País. A justiça ao arbítrio da Política, torcendo-lhe a vara ao ponto de fazer dela saca-rolhas.
Dois partidos sem ideias, sem planos, sem convicções, incapazes, vivendo ambos do mesmo utilitarismo céptico e pervertido, análogos nas palavras, idênticos nos actos, iguais um ao outro como duas metades do mesmo zero, e não se malgando e fundindo, apesar disso, pela razão que alguém deu no parlamento, de não caberem todos duma vez na mesma sala de jantar."
Guerra Junqueiro, "Pátria", 1896.
[.] Uma burguesia, cívica e politicamente corrupta até à medula, não descriminando já o bem do mal, sem palavras, sem vergonha, sem carácter, havendo homens que, honrados na vida íntima, descambam na vida pública em pantomineiros e sevandijas, capazes de toda a veniaga e toda a infâmia, da mentira à falsificação, da violência ao roubo, donde provém que na política portuguesa sucedam, entre a indiferença geral, escândalos monstruosos, absolutamente inverosímeis no Limoeiro.
Um poder legislativo, esfregão de cozinha do executivo; este criado de quarto do moderador; e este, finalmente, tornado absoluto pelaabdicação unânime do País. A justiça ao arbítrio da Política, torcendo-lhe a vara ao ponto de fazer dela saca-rolhas.
Dois partidos sem ideias, sem planos, sem convicções, incapazes, vivendo ambos do mesmo utilitarismo céptico e pervertido, análogos nas palavras, idênticos nos actos, iguais um ao outro como duas metades do mesmo zero, e não se malgando e fundindo, apesar disso, pela razão que alguém deu no parlamento, de não caberem todos duma vez na mesma sala de jantar."
Guerra Junqueiro, "Pátria", 1896.
2 Comments:
Boa tarde OLHO NU
Mudam-se os tempos, mas não se muda as atitudes;isso é que é incrível.
Não passa de hipocrisia quando se diz, que o poder é exercido em nome do povo. Os congressos e os parlamentos eleitos com essa função nos países democráticos são tumores nacionais, os quais, insuficientemente tratados a cada eleição, voltam a crescer, para disseminar com empenho redobrado a metástase da corrupção.
Nada mais é do que hipocrisia quando se diz que o povo é sábio. A maior parte, a parcela que elege os dirigentes, comporta-se como um indolente rebanho, tocado para lá e para cá pelos capatazes políticos através de promessas que nunca se cumprirão.
Continuamos numa situação escandalosa. Até que haja uma mudança … vamos continuar a vegetar, a ouvir uma espécie de juízo crítico parido em grupos, a vomitar de nojo e a engolir sapinhos.
Eu acreditava que tudo quanto era errado, nocivo ou inútil, não poderia durar para sempre, mas lendo a sua postagem, fico com sérias duvidas
Olhem para o povo, e não o tratem como se tivessem quatro anos, somos já suficientemente crescidos para entendermos todas as jogadas de bastidores.
111 anos depois... confirma-se...
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